Bom dia, família! É a reunião da série Bom dia Gifs, obra que Carolina Sá já vinha desenvolvendo há algum tempo, e que agora expõe em espaço virtual. Esta exposição é o resultado de sua investigação sobre as relações entre o cubo branco, enquanto espaço institucional da tradição, e as possibilidades de ocupá-lo com imagens do universo digital. Aqui, a obra se apresenta integralmente em sua dimensão imaterial. Carolina opera um deslocamento das imagens que acompanham mensagens de “Bom dia”, usualmente replicadas na rede social de WhatsApp, em grupos de família, em geral exageradamente sentimentais, e as substitui por imagens jornalísticas de extrema violência. Provoca dessa maneira um choque que cria um mal-estar e uma reflexão sobre que tipo de subjetividade é capturada na construção imagética dos meios comunicacionais contemporâneos.
Este espaço proposto pela artista é tratado para provocar uma sensação claustrofóbica ao se navegar neste ambiente sem encontrar vias de escape. A ocupação das paredes e teto deste cubo ficcional, organizada por justaposição de Gifs, hiper dimensionados, cria uma saturação visual e um consequente estreitamento do espaço. As cores acabam também por potencializar o choque diante das imagens, ao mesmo tempo em que os pequenos pontos de brilhos animados funcionam, aqui, como um eufemismo visual. Carolina se vale também de um pedestal tradicional, posto em uma quina da sala, onde disponibiliza o QR Code para acesso ao banco de imagens dos Gifs expostos. A partir de tais pacotes de figurinhas ela opera uma reinserção dessas imagens ao circuito de onde elas se originaram. A sonoridade utilizada pela artista traz uma camada de sentido ao replicar sons de notificações capazes de perturbar a noção do que é estar imerso no virtual e simultaneamente fora dele. Talvez, a aflição que as imagens viscerais provocam nos leve à ilusão de que o que ouvimos é uma chamada para checarmos nossos dispositivos móveis, e assim, interromper a experiência. Dessa maneira, o elemento sonoro assume a função linguística de ruído comunicacional para nos fazer refletir sobre os limites da nossa tolerância à alienação e os limites da nossa suportabilidade à barbárie que nos afronta.
O trabalho de Carolina Sá responde às reverberações vindas de longe, de uma linhagem conceitual da arte que confere liberdade quanto ao uso dos meios e questiona a noção de autoria. Nesse sentido, Carolina pensa suas produções de forma híbrida se apropriando da imagética pré-existente no mundo para recontextualizá-la em sua obra. Quando a artista se apodera das imagens técnicas midiáticas, usa procedimentos duchampianos reatualizados na relação entre arte e mídia. O trabalho Bom dia gif nos remete diretamente à obra Car Crashes de Andy Warhol, tanto pela utilização de imagens de violência veiculadas em jornais, que ele reproduzia pela técnica de serigrafia, quanto pela estetização dessas imagens. Essas repetições, ao mesmo tempo que esvaziam significados traumáticos, também funcionam como uma defesa contra o afeto do trauma.
A exposição traz reflexões sobre os afetos deflagrados por imagens digitais, discute os processos de representação e reprodução imagética na construção das subjetividades e como no jogo de espelhos, nos confronta com nossa própria imagem em crise.
Flávio Medina e Paula Souza.
Bom dia, família!
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